Infodefensa visitou no início de dezembro as instalações da mais antiga Indústria Estratégica de Defesa do Brasil, cuja gênese pode ser traçada quando da chegada da Família Real Portuguesa na Colônia ultramarina em 1808, evento que possibilitou o estabelecimento da primeira unidade fabril estratégica no País, a Real Fábrica de Pólvora da Lagoa Rodrigo de Freitas, cidade do Rio de Janeiro.
A Indústria de Material Bélico do Brasil (Imbel) foi criada em 14 de julho de 1975 (Lei nº 6.227), estando vinculada ao Ministério da Defesa por intermédio do Comando do Exército. Em 2013, a Imbel recebeu o título de 'Primeira Empresa de Defesa do Brasil'.
Na Fábrica de Itajubá (FI), visitada pela reportagem, são produzidos os fuzis de assalto e carabinas IA2 em dois calibres, pistolas semi-automáticas de diferentes características, fuzis snipers para atiradores de elite, facas de combate, etc.
A Imbel está organizada como um conglomerado de cinco fábricas, cujos produtos resultam de processos industriais diferentes (químicos, mecânicos e metalúrgicos).
A Fábrica da Estrela (FE) localizada em Magé (RJ) produz explosivos; a Fábrica Presidente Vargas (FPV) localizada em Piquete (SP) é, também, uma fábrica química produtora de explosivos; a Fábrica de Itajubá (FI) localizada em Itajubá (MG) é uma fábrica mecânica produtora de armas; a Fábrica de Juiz de Fora (FJF) é uma fábrica química, mecânico-metalúrgica que fabrica, carrega e monta munições de grosso calibre para o Exército; e a Fábrica de Material de Comunicações e Eletrônica (FMCE) localizada no Rio de Janeiro (RJ) produz equipamentos de comunicações e sistemas eletrônicos diversos.
A gênese do Imbel IA2
O IA2 é fruto de estudos do Centro Tecnológico do Exército (CTEx) e da Imbel para substituir o FN FAL e suas variantes, em uso com o Exército Brasileiro desde 1964. A nova arma começou a ser testada no Centro de Avaliações de Exército (CAEx), no Campo de Provas de Marambaia, Rio de Janeiro, em 2010.
Em 2012, foi colocada uma encomenda inicial de 1.500 fuzis IA2, na variante de 5.56mm e 7.62 mm, para serem distribuídas entre várias unidades como a Brigada de Operações Especiais, a Brigada de Infantaria Paraquedista e as Brigadas de Infantaria de Selva. O IA2 é classificado como um fuzil de fogo seletivo, em calibre 5.56x45mm NATO, utilizando sistema de ferrolho rotativo, com sete ressaltos.Também possui uma versão em calibre 7,62mm utilizando sistema de ferrolho basculante, similar ao empregado anteriormente no FAL.
Mesmos com sistemas de ferrolho diferentes, ambos os fuzis tem características similares, como o sistema por acionamento de gases (na qual os gases resultantes do disparo são desviados para um tubo acima do cano, que empurram um pistão, localizado no tubo, que empurra o kit do ferrolho, liberando o estojo e carregando a câmara com outra munição), detalhes da mecânica foram alterados (como por exemplo, o extrator que teve seu desenho modificado para melhorar o processo de ejeção dos cartuchos deflagrados e o posicionamento do percussor foi modificado).
Seu seletor de modo de disparo trabalha em três posições, Segurança (S), Fogo Semi-Automático (SA) e Fogo Automático (A).
O IA2 tem design avançado com amplo uso de peças em polímero, como a nova empunhadura. A coronha, inicialmente, na versão 5.56mm, foi projetada com uma montagem telescópica, em polímero, muito similar à utilizada no fuzil FN SCAR.
Com o tempo, essa solução foi abandonada em favor da coronha rebatível em material plástico da versão 7.62mm, mais barata e fácil de fabricar.
Mantiveram-se duas características do FAL, a alavanca de acionamento do ferrolho, posicionada no lado esquerdo do fuzil (não é ambidestra nem intercambiável), e o seletor de modo de tiro, posicionado no lado esquerdo do conjunto do gatilho da arma, o que dificulta a operação por atiradores canhotos.
As variantes em calibre 5.56 mm usam carregador STANAG 4179 (30 munições) padrão OTAN, já a versão em calibre 7.62 mm utiliza carregador padrão do FAL (20 munições). A alça de mira é do tipo rampa deslizante, com as posições de 150 e 250 metros, sendo regulável no plano horizontal com o auxílio de uma chave de fenda. A massa de mira é regulável em altura.
A caixa de culatra e guarda-mão receberam trilhos picatinny, o IA2 pode ser equipado com uma vasta gama de acessórios, que incluem lunetas, miras red-dot, miras holográficas, intensificadores de imagem, lanternas táticas, lança-granadas M203 de 40mm, unidades de controle de tiro, designadores a laser, entre outros acessórios.
O cano é equipado com um quebra-chamas padrão OTAN, capaz de disparar granadas de bocal. O fuzil pode ser equipado com uma baioneta IA-2 ou AMZ, fabricados pela Imbel.
O projeto IA2 está sendo oferecido no mercado internacional de armas em quatro versões, o fuzil em calibre 5.56x45mm NATO, feito para substituir o Imbel M964 FAL no Exército Brasileiro e na Marinha do Brasil, o Heckler & Koch HK33 na Força Aérea Brasileira e o Colt M-16A2 no Corpo de Fuzileiros Navais (juntamente com o fuzil em calibre 7.62x51mm NATO), a carabina semi-automática em calibre 5.56x45mm NATO e a carabina semi-automática em calibre 7.62x51mm NATO, para combates em ambientes fechados e operações policiais.
O Exército Brasileiro fez uma encomenda inicial de 1.500 fuzis em 2013, e mais recentemente, o Comando Logístico do Exército (COLOG) colocou uma nova encomenda de 20.000 armas, visando equipar gradativamente as unidades de pronto emprego da Força Terrestre.
A Polícia Militar do Estado de São Paulo adquiriu um lote de 500 carabinas em 2014 para equipar a ROTA e a Força Tática, unidades policiais que demandam armamento mais efetivo e moderno.
Diversos interessados estão negociando com a Imbel novos contratos de aquisição. A demanda por um fuzil moderno no mercado doméstico e sul-americano é muito grande, e outros mercados considerados promissores estão no continente africano, no extremo asiático, incluindo países do Golfo Pérsico, dentre outros.
*Este é o primeiro de uma série de artigos sobre fábricas da Base Industrial de Defesa brasileira. Na próxima parte, o tiro com o fuzil IA2 calibre 5,56mm.
As instalações antigas, da primeira metade do século XX, são mantidas em ótimas condições. Nos pavilhões, máquinas de fresamento e corte a laser CNC digitais desfilam sua modernidade lado a lado com veneráveis sistemas mecânicos analógicos.
Nos fornos, independente do clima ou da modernidade, o calor faz o seu trabalho. De vez em quando, o som de armas automáticas atirando toma conta do ambiente, os fuzis e pistolas que acabaram de ser fabricados estão sendo testados no estande de tiro. Por todos os lados, funcionários executam várias tarefas de forma organizada, afinal é mais um dia de trabalho na fabrica da Imbel em Itajubá, pequena cidade no interior de Minas Gerais.
Imagens: Roberto Caiafa